Diletantismo x obrigação

Vilma veio ler Arroz soltinho e logo começou a rir sem parar: “Eu nunca tinha percebido como é difícil fazer arroz.” Pois é. Se você quiser explicar uma receita direitinho àquele que não sabe cozinhar, sai um texto enorme e complicado - mesmo que cada passo leve apenas alguns segundos.

Uma das coisas que percebi logo de começo é a dificuldade de se fazer uma receita exatamente da mesma maneira da vez passada. Lembra aqueles exercícios de estatística, nos quais a probabilidade de algo acontecer duas vezes seguidas é um número cheio de zeros na frente. A gente sempre muda alguma coisa, são muitos passos e muitos detalhes; na maior parte das vezes, acerto de primeira e arruíno tudo na segunda vez, quando acho que já sei fazer a receita. Esqueço qual era a quantidade de algum ingrediente, deixo um pouco a mais no fogo. Mas não é só o esquecimento, muitas vezes queremos experimentar alguma variação na receita, comprar uma marca ou tipo diferente de alguma coisa. Normalmente, depois temos de assumir a culpa pela audácia.

O desafio de ser um cozinheiro incidental é justamente o fato de cozinhar bem quer dizer cozinhar sempre, cozinhar por obrigação e cozinhar sem mudar nada, nunca. A constância aqui é uma virtude. As cozinheiras excelentes são as Tias Anastácias de antigamente, que eram obrigadas a cozinhar todos os dias para a família inteira e repetiam toda semana as mesmas receitas por anos a fio, sem poder errar, possivelmente sem televisão ou até mesmo rádio para atrapalhar. Pensando bem, talvez esse seja mesmo o papel social dos hobbies: permitir dar asas ao nosso lado aventureiro, que poderia trazer riscos ao bom funcionamento da sociedade se despertado durante nossas ocupações normais.

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